foto por Marjon Buurema

quinta-feira, 25 de março de 2010

TEMPO, PARA QUE VOS QUERO

Hoje adormecemos no Porto.

Fizemos a viagem de comboio e deixamo-nos invadir pela sensação adolescente de aventura que as viagens nos despertam, especialmente em boa companhia e sem preocupações com trânsito, horários, itinerários. Muito ecológico, comentava alguém no Facebook da Susana... Muito "Almalógico", diria eu!
Quem vive em permanente corrida atrás dum tempo "Obikwelo", sabe à partida que, não só o pódio nunca será seu, como ainda se arrisca aos lugares da vergonha, penúltimo, ultimo ou pior, o dos resgatados à miséria de se arrastarem até à queda. E pergunta ilógica e, quem sabe, absurda nos dias que correm: porque não mandar o tempo à fava? (as asneiras explicitas guardo para programas com bolinha vermelha e apenas de 15 em 15 anos...). Ou mandar o "tempo" ao Coliseu do Porto, daqui a umas horas, programa que recomendo com obvia veemência e sincera convicção? Ou fazerem do "tempo" o que vos der na real gana, mas sermos nós a fazer dele qualquer coisa, e não o contrário.
Comecei a viagem, como tanta gente, na satisfação de quase 3 horas bestiais para pôr coisas em dia, coisas em ordem, coisas arrumadas. E é telefonema atrás de telefonema, email, Coisas para tratar, mas algures, no meio do caminho vou vislumbrando quão próximo da minha própria "bestialidade", eu vou. De que me vale todo o sucesso das arrumações que posso progredir nessas horas, se deixar fugir "O Instante" de saborear a companhia da Viviane, que acabados os concertos abala para o Algarve e faz da Rua da Saudade uma auto-estrada grande demais? E perder as expressões Félix da Susana que têm mais cambiantes por milésimo de segundo do que os bites internéticos que estou a tentar dominar entre redes em fuga de um comboio em andamento? E falar da nossa Luanda que não nos podendo acompanhar na odisseia tem mais formas de ser relembrada por nós do que alarmes programados em relógios de alto rigor?
Parece um lugar-comum, mas na verdade sinto que hoje adormeço no Porto, mas" acordei" no comboio. E desconfio que ao meu lado seguia muita gente parecida, a lutar contra o relógio da vida, mas "obrigados" aquela limitação de espaço, tempo e carris e talvez com muito menos motivos do que eu para enganar o tempo ou mandá-lo pastar...
Vinha, e venho-vos relembrar e convidar para esta celebração de Ary que continua, hoje já, dia 26 de Março, no Porto.
Mas não podia deixar de contar um bocadinho mais do que me acontece nesta viagem magnifica, que começa num poeta, na palavra transformadora que ele trás e na vida que ele, inevitavelmente, gera.
A palavra, essa que vos vamos apresentar daqui a pouco embalada nalgumas das melhores melodias de sempre, só faz sentido quando ENTRA na vida. Cria raízes e germina...
E o poeta reza assim:
"Tempo para agarrar cada momento deste tempo
Interminável e absoluto rasgo o tempo
Num temporal, com os ponteiros do minuto
Tempo, para um relógio bater certo com a vida
De um homem bom, de um são, de um homem forte
Que da chegada, conseguir fazer partida
E que desperta adiantado para a morte:"
Até já, no Coliseu do Porto, ou, quem sabe, num comboio qualquer. Em ambos se pode acordar, para o que realmente importa...

5 comentários:

  1. Olá menina!!
    :-)
    Dizer-te apenas que partilho cada momento desta vossa e nossa aventura, com um prazer indizível e derradeiro.
    Com uma sensação forte e, permite-me, algo intimista de, também contigo, convosco, atravessar um tempo que, para mim, para ti, para tantos,para todos nós,continua a representar um espaço e uma memória incrivelmente fortes.
    Falo do "Fadiário" (olá Pinguim cris, é muito bom ver-te por aqui, acredita!).
    Que este novo ponto de encontro possa ser, acredito que vai ser,um digno continuador do tempo sem tempo, com muita ternura e com um carinho infinito, que representou aquele espaço.
    Beijo.

    ANTÓNIO

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  2. Esse é o grande desafio dos dias de hoje, não perder "O Instante", saber quando e como parar para poder ver o que realmente de belo se passa à nossa volta, os inúmeros pormenores que nos escapam e que quando nos disponibilizamos a olhá-los deixam de ser meros detalhes e tornam-se importantes pelo que significam, pelo que traduzem...

    Tenho pena de não poder estar no Porto para me deixar absorver pelo instante, pelo que de belo nos traz as palavras de Ary dos Santos, pelas emoções que despertam as quatro vozes deste projecto(em especial da "nossa" Mafalda) e pelo sentimento de saudade que só temos do que é realmente bom.

    Desejo-vos um excelente concerto e que todas as pessoas que irão poder assitir se deixem levar por esse instante único que vocês lhes irão proporcionar!

    Para ti António um "bem haja", é sempre fácil este reencontro junto da Mafalda Arnauth!

    Beijo
    Cristina

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  3. Olá Mafalda.

    Ainda me lembro das nossas viagens de comboio a Braga, já lá vão quase 20 anos! Era um divertimento do inicio ao fim!

    Parabéns pelo teu sucesso :o)

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  4. Dias depois do momento no Teatro Curvo Semedo (Montemor-o-Novo), em que atravessei a Rua da Saudade, e em que puramente deixei-me levar pelos sentimentos e pelas emoções. Fiquei completamente eléctrico...

    Sou de uma geração que não soube o que era viver em censura. No entanto, o profundo contacto que tive com a História, nos tempos de Universidade, deu-me para perceber (ou ter a noção)

    Porém, com o concerto de Sábado, em terras alentejanas, tive a percepção... Foi bom, ouvir, saborear, e deixar-me arrastar pelo tempo...

    Foi bom ouvir a "Desfolhada", a "Tourada", "Estrela da Tarde", "Canção do Tempo", "Kyrie", etc, etc, etc... Com um pormenor... depois de 1974!

    E aqui está a intemporalidade da arte.
    Durante o espetáculo não pude deixar de pensar como tudo aquilo que ouvia era mais que actual!
    Porque de facto aquilo que eu mais aprecio em Ary é a confrontação com aquilo que somos e que podemos ser. E hoje não gostamos de ser confrontados com algumas duras realidades!

    E por isso, só quero, deixar à Mafalda, à Susana, à Viviane e à Luanda os meus parabéns, porque conseguiram o melhor que há em Ary dos Santos - a nossa própria confrontação...

    Beijinhos!!!

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  5. Mafalda,

    és uma inspiração no que cantas, escreves e és!

    Este blog é um pérola preciosa!

    Obrigada!

    Baci**

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