foto por Marjon Buurema

terça-feira, 6 de abril de 2010

SABER MORRER… PARA SABER VIVER!

Foram de êxtase os dias seguintes à estreia tão aguardada da “Rua da Saudade” em palcos tão emblemáticos como o são os Coliseus. De êxtase, de interiorização, de revolução, de celebração e até de dor, de tão intenso e real que tudo foi.
No final dos concertos, assistir ao encontro dos nossos amigos e familiares uns com os outros, connosco, com aquela atmosfera de família que criamos, foi perceber que a vibração tinha passado para lá do palco e nos tinha ultrapassado enquanto detentores de um tesouro tão especial como aquele para o qual nos preparamos.
Começou a nossa viagem com Ary e apenas podemos ansiar que esta seja longa e tão bonita como estes dias!
E a seguir a tudo isto… acontece a Páscoa!
Que talvez ainda mais do que o Natal, se vai caracterizando para tantos como um período de férias escolar, de feriados laborais, de razões menos imperativas para que se enviem mensagens colectivas de votos de Boa Páscoa, mas ainda assim, com alguma obrigatoriedade, e onde ganhamos mais uns quilinhos que somados ao Natal e justificados com o intenso e prolongado Inverno, tornam urgente que Primavera se instale DE VEZ!
Mas esta Páscoa, sem ir totalmente ao encontro dos “menos tantos” para quem o significado religioso continua a ser profundo e autêntico, dei por mim a escolher SENTI-LA, de novo, mas agora à minha maneira… Muito New Age, diriam alguns dos amigos com quem celebrei tantas Ultimas Ceias e outros tantos Aleluias genuínos, que faziam dos sábados da Páscoa uma verdadeira explosão de felicidade, de alivio e de regresso a uma respiração merecida.
E pela primeira vez, consegui experimentar na simbologia cristã, a sexta feira Santa menos deprimente da minha vida. Porque mesmo na visão do Cristo cruelmente torturado, de forma tão cobarde e bárbara, forma esta capaz de se entranhar nas nossas culpas mais profundas por pelo menos mais um ano até a próxima Páscoa, eu consegui pela primeira vez lembrar-me que só por este processo lhe foi permitido “regressar”, ressuscitar e cumprir o caminho que o tornava finalmente Maior. Se calhar o lapso é seguramente meu, porque ficava tão aterrada com a Via-sacra, que descrevia passo a passo o torturante caminho de Cristo até ao Calvário, que chegada ao momento da Ressurreição, como comum mortal, tinha tremenda dificuldade em achar que alguém pudesse voltar, ou melhor, QUISESSE voltar, depois de tanta agonia.
E se vos escrevo sobre este tema, também já não é seguramente nem com o fim de reabilitação católica de ninguém e muito menos de julgamento religioso de alguém. Escrevo apenas porque verdades ou símbolos, realidade ou parábola, aquilo que tanto nos influenciou ao crescer, pode de um momento para o outro transformar-se novamente e ser outra fonte de crescimento, agora!
Talvez um dos maiores medos do ser humano seja o da própria morte. Para muitos nem é o quando, mas sim o como, de que forma, quanto tempo. E por isso passamos a vida fugindo de outras pequenas (e algumas grandes…) mortes que precisamos MESMO vivenciar. Aceitar. Querer.
E mais ainda, fugimos da nossa Via-Sacra, escolhendo um caminho quantas vezes aparentemente mais fácil, mas que eu acredito que nos leva sempre de regresso à dificuldade que escolhemos não resolver. Desta vez com mais quilómetros pela frente e mais cansados. Mas se temos de lá passar é por algum motivo, que acredito cada vez mais, que é Muito Bom… e talvez por isso custe tanto lá chegar.
Esta Páscoa “morreram-me” definitivamente algumas coisas.
Mas porque já vinham tão moribundas e doentes, que já não dava para ignorar ou insistir nelas. No baú que guardamos do Passado, além das fotografias, das memórias infinitas e mágicas, temos quantas vezes os monstros do nosso apego excessivo, das nossas carências, dos nossos medos por responder. Mas em vez de me atormentar, como fazia, com a morte de todos os Cristos do Mundo, que infelizmente são tantos, aceitei que é assim o processo da vida e a renovação do que cá andamos a fazer.
No Presente, precisamos deixar para trás alguns desses pedaços nossos, porque não deixam de o ser por serem menos bons. Devemos mesmo agradecer-lhes por tudo o que nos revelaram de nós próprios. Respeitá-los, mas deixá-los ir. Se não fizermos, não damos lugar ao novo “nosso” que está para acontecer.
Se o fizermos, o ar entra com muito mais força e intensidade quando inspiramos.
O nosso riso tem um alcance muito maior do que alguma vez teve.
O nosso carinho consegue tocar muito mais gente.
Temos muito mais espaço para ter paciência.
Muito mais lugar para guardar sabedoria.
Muito mais Vida para curtir.

Morrer dói, pois. Mas não Viver dói infinitamente mais…
Bom “Regresso”…

1 comentário:

  1. Muito bom post... apropriado ao tempo que acabámos de viver - a Páscoa!
    É isto que Cristo nos vem trazer de novo: a confrontação com nós mesmos e com a verdade da nossa vida, e que muitas vezes teimamos em fugir dela. Mas só na medida, em que aceitarmos essa verdade (que é nossa), podemos pegar na Cruz, morrer na Cruz e Ressuscitar para uma vida nova...
    E, actualmente, faz-nos falta esta confrontação, com aquilo que nós somos. Que podemos sempre mais e mais...
    É preciso acreditar na vida, e que podemos fazer dela a medida do nosso valor...

    Beijinhos!

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